O pior acidente da história da Varig: 50 anos do voo 820

O pior acidente da história da Varig: 50 anos do voo 820

Hoje (11/7), completam-se 50 anos do pior acidente da história da Varig: o voo 820, que fez um pouso forçado em uma plantação de repolhos nos arredores da capital francesa.

História

Era noite de terça-feira, 10 de julho de 1973. O Aeroporto Internacional do Galeão estava, como de costume naquela época, movimentado. O guichê da Varig repleto de filas: além do RG-820 com destino a Londres com escala em Paris, outros voos intercontinentais da companhia também se preparavam para partir.

O equipamento escalado para cumprir o 820 daquele dia era o Boeing 707-345C de matrícula PP-VJZ e número de série 19.841. O exemplar fora construído em 1968 e, após operar voos fretados transportando tropas norte-americanas entre os Estados Unidos e o Vietnã pela Seabord, a Varig o incorporou em 1971.

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Foto: Arquivo Flap

Antes da partida, um Electra da empresa pousou no Galeão vindo de São Paulo trazendo passageiros que embarcariam para Londres e Paris. A aeronave estacionou ao lado do 707, facilitando assim a conexão dos viajantes. Com todos os trâmites burocráticos resolvidos, a tripulação se dirigiu ao VJZ para finalizar a preparação da cabine e receber os passageiros. Sentado no lado esquerdo da cabine, Gilberto Araújo da Silva, comandante do voo, acompanhado de Antônio Fuzimoto, primeiro-oficial, e dos dois copilotos, Alvio Basso e Ronald Utermoehl.

Com as portas fechadas, os quatro motores P&W começaram, um a um, a serem acionados. A 0h03 de 11 de julho de 1973, o voo 820 da Varig decolava da pista 15 do Galeão rumo ao Aeroporto Paris-Orly com 17 tripulantes e 117 passageiros, incluindo personalidades como o cantor Agostinho dos Santos, a atriz e socialite Regina Lecléry, o iatista Jörg Bruder, o senador Filinto Müller, então presidente do Senado Federal, e os jornalistas Júlio Delamare e Antônio Carlos Scavone.

Minutos após a decolagem, o aviso dos cintos fora desligado, assim como o de não fumar. O serviço de bordo, ou melhor, banquete, era iniciado e comandado pelo chefe de cabine, João Egídio Galetti. Às 3h26, o quadrimotor voava a 37 mil pés e bloqueava a vertical de Recife, iniciando sua travessia pelo Atlântico.

Às 4h30, como o programado, o comandante Gilberto foi acordado de seu descanso para assumir novamente os controles do 707. O cruzamento do Atlântico aconteceu de forma tranquila e, por volta das 12h (horário zulu), o quadrimotor ingressava o território europeu pelo sul da Espanha.

Naquele momento, os lavatórios do jato já haviam sido utilizados inúmeras vezes e centenas de toalhas de papel se acumulavam nas lixeiras. Um passageiro entrou no banheiro central da classe econômica e acendeu um cigarro. Paralelamente, o serviço de café da manhã era iniciado na primeira classe. Antes de sair do banheiro, o passageiro jogou o cigarro em uma das lixeiras, lavou suas mãos e se dirigiu ao seu assento.

O jato começava a se aproximar da capital francesa pelo setor sudoeste e iniciou a descida de nível de cruzeiro. Os trabalhos na cabine de comando eram intensos. O mecânico de voo, Claunor Bello, acendera as luzes de colocar os cintos e de não fumar, portanto, o movimento nos banheiros cessou. Simultaneamente, a brasa do cigarro se alastrava pelos papéis na lixeira. Embora não houvesse cheiro de queimado a bordo, o 707 deixava um fina esteira branca de fumaça, lançada ao exterior pelo sistema de exaustão.

Próximo das 15h (local), o comandante Gilberto, que gerenciava as comunicações com o controle em Paris, alertou aos passageiros que o pouso no Aeroporto de Orly aconteceria em alguns minutos, que a temperatura era 26º C e passou instruções de segurança finais antes da chegada. Ninguém a bordo do voo 820 havia percebido o que estava acontecendo. Ainda que o aviso dos cintos estivesse ligado, uma passageira decidiu ir ao toalete e optou pelo da esquerda. O fogo já havia destruído a tubulação dos exaustores e a fumaça, até então restrita ao compartimento do banheiro central, começou a invadir o banheiro esquerdo, onde a usuária estava. Cercada por fumaça e assustada, ela saiu rapidamente do local e alertou os comissários sentados próximos aos lavatórios. O fogo já se alastrava e atingia as primeiras conexões elétricas.

A notícia do fogo a bordo começou a se espalhar entre os passageiros, e o mecânico Claunor buscava entender o que havia acontecido com o disjuntor 77 no painel P-6, que havia sido desarmado sem seus comandos por conta do então desconhecido fogo.

Os comissários Mascarenhas, Tersis e Carmelino, que estavam na parte traseira do jato, examinavam o banheiro esquerdo, mas não havia sinal de fogo, apenas fumaça, e não olharam o toalete central. No entanto, começaram a tomar providências para resolver o problema: comunicaram o comandante, desligaram os equipamentos elétricos na galley traseira e buscaram extintores de incêndio. A confusão sobre de onde a fumaça estava realmente vindo, fez com que nenhuma das ações para controlar a situação fossem válidas.

Assim que recebeu a informação, Gilberto comunicou Orly sobre o fogo a bordo e solicitou uma descida de emergência. No aeroporto, emitiu-se um “alerta verde”, equivalente a um pequeno risco de acidente. A fumaça já estava densa e se espalhando agora pela galley traseira. Já não era mais possível se aproximar do foco do incêndio sem máscara. A movimentação intensa dos tripulantes assustava os passageiros.

O jovem Ricardo Trajano, que originalmente havia se sentado na poltrona 27F, na penúltima fileira do lado direito, levantou-se de seu assento e correu para a parte frontal da aeronave, onde ficou próximo da porta. Nenhum dos comissários contestou sua atitude, tampouco outro passageiro repetiu a ação.

Com máscaras e óculos antifumaça, Gilberto, Fuzimoto, Basso, Zilmar e Claunor estavam na cabine de comando verificando as alternativas que lhes restavam, já sem conseguir visualizar os instrumentos. Pouco a pouco, os passageiros foram desmaiando, perdendo a consciência e morrendo, em um profundo silêncio. Com a situação caótica, Gilberto decidiu pousar o quadrimotor no primeiro local possível.

Antes de tocar o solo, todos os motores foram cortados e, faltando cinco quilômetros, ou um minuto para chegar a Orly, o PP-VJZ atingiu a plantação de repolhos. Foram alguns impactos, e, em cada um deles, uma parte da aeronave se soltou. O 707 se arrastou pelo campo e quando parou por completo, sua fuselagem estava praticamente intacta. Dos 17 tripulantes, dez se salvaram. Já os passageiros… apenas um: Ricardo Trajano.

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Foto: Wikimedia

Logo após sua parada final, vários ocupantes provavelmente ainda estavam vivos, contudo, inconscientes e impossibilitados de deixarem seus assentos. Ricardo estava com seu corpo bastante queimado e foi resgatado pelos bombeiros, que o encontraram logo na porta da aeronave. Os outros acabaram dominados pelo fogo.

Dez minutos após a queda, os bombeiros de Orly, mais bem-preparados, chegaram ao local e rapidamente controlaram o incêndio. Às 15h50, havia apenas uma fina coluna de fumaça saindo dos destroços. Os feridos já haviam sido transportados aos hospitais.

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Foto: Wikimedia

O pouso, ainda que bem-sucedido dadas as condições críticas, acabou não salvando a maioria dos ocupantes a bordo: 122 pessoas morreram no acidente.

E foi assim que terminou o fatídico voo 820 entre o Galeão e Paris daquele 11 de julho de 1973.

A teoria de que o incêndio teria sido causado pelo cigarro é a que consta no relatório final, no entanto, outras hipóteses foram levantadas na época, como a de que mísseis do caça Mirage, supostamente a bordo do 707, haveriam sofrido uma combustão espontânea e gerado o fogo. Outra teoria aponta que uma carga ilegal se desprendeu do compartimento de bagagens gerando um gás letal e asfixiando a maioria a bordo.

Relato baseado no livro Caixa Preta

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